Usar carregador pode? Qual o mais adequado? Enrolar o recém-nascido como um charutinho é apropriado? E o andador? Ajuda ou atrapalha no desenvolvimento? Essas e outras dúvidas são muito comuns aos pais, sejam eles de primeira viagem ou já experientes.
Para ajudar a compreender um pouco melhor a anatomia infantil e quais os problemas que o uso de alguns assessórios pode causar, convidamos o ortopedista pediátrico David Nordon para essa entrevista ping-pong. O especialista é formado pelo HC-FMUSP e Preceptor de Ortopedia Pediátrica da PUC-SP.
1 – Existem diferentes tipos de carregadores para bebês. Um deles é o sling – faixa de tecido com aproximadamente cinco metros de comprimento por 60cm de largura, que possibilita diferentes tipos de amarração – bastante usado pelas mamães modernas. É verdade que esse assessório pode causar displasia de quadril na criança?
Não, isso é um mito! O sling, na realidade, é um dos melhores tipos de carregadores que existe. Ao ser usado de forma correta – na posição de sapinho – ele mantém o quadril na posição adequada para prevenir a displasia do quadril. Por outro lado, existem alguns slings mais curtos, que geralmente já vêm com argolas, e são ajustados com a criança coladinha à frente da mãe ou pai, onde as pernas ficam muito juntas. Esse tipo pode causar problemas.
2 – E o carregador tipo “canguru”? Esse está liberado ou tem restrições de uso? Quais problemas pode causar?
Para o canguru é o mesmo tipo de atenção. Poucas marcas são consideradas verdadeiramente ergonômicas e, assim, podem causar displasia do quadril. A marca ergonômica deve conseguir deixar o bebê sentadinho, na mesma posição de sapinho, com as pernas bem abertas. O apoio da “cadeirinha” do canguru deve chegar até a prega dos joelhos, apoiando bem o bebê – da mesma forma como o sling na amarração tradicional. A principal complicação é a displasia do quadril. O bebê, ao ficar em uma posição inadequada, com todo o apoio na virilha e as pernas caídas, força o quadril para fora. Outras complicações, como problemas de circulação, são raríssimas.
3 – As cadeirinhas de carro são seguras e anatomicamente adequadas? Existe um modelo ideal? Como a criança deve ser posicionada?
Sim, as cadeirinhas são excelentes (desde que sejam de marcas confiáveis e aprovadas pelos órgãos de regulação) e são a melhor forma de proteger os pequenos em acidentes de carro. Elas diminuem o risco de morte em mais de 70%!
Lembre-se que, com a nova legislação, deve-se usar:
- Cadeirinha voltada para trás, até 13 kg;
- Cadeirinha voltada para frente, até os 4 anos;
- Elevador de assento, até os 10 anos;
- A criança precisa ter pelo menos 1,45m, ou não conseguirá usar o cinto de segurança de três pontas adequadamente (ele não funciona em crianças abaixo desta altura!).
4 – Qual a sua opinião sobre o andador? Verdade que o acessório, ao contrário do que se pensa, não estimula a criança a andar?
Por mim (e em vários países do mundo), o andador deveria sair de circulação para sempre. Ele não só atrapalha a criança a andar, como atrasa; faz aprender a andar de forma errada; aumenta o risco de displasia do quadril. Por fim, aumenta, e muito, o risco de morte.
Por isso, prefira o empurrador, que é aquele igual ao de idosos. A criança somente precisa empurrar.
5 – Enrolar o bebê em uma manta, como um charutinho, pode comprometer o quadril da criança? Por qual motivo isso acontece?
Sim, pode levar à displasia de quadril. Deixar o bebê com a perna esticada e apertadinha forçará o quadril a sair do lugar. Essa é a principal causa que leva ao problema. Nas populações de esquimós italianos e índios sul-americanos, que têm esse costume, a incidência de displasia é muito maior. No entanto, fazer um “charutinho” que deixa as pernas soltas, não tem problema.
6 – Como você recomenda que o bebê seja colocado na manta ou no cobertor para ser segurado no colo ou colocado no berço ou carrinho?
Aqui é importante que a criança esteja sempre com as perninhas soltas. Não é recomendado o uso de cobertores ou mantas para cobrir a criança quando é muito pequenininha por conta do risco dela não conseguir se descobrir e ficar sem ar. Quando colocar o bebê deitado com mantas e cobertores, o ideal é prender as bordas para que ele não consiga se enrolar nelas quando se mexer. Lembre-se de garantir que as pernas estejam livres. Na hora de pegar no colo, a melhor posição é a de sapinho, jamais force o fechamento das pernas do bebê. Também, nos primeiros seis meses, o bebê sempre deve dormir com a barriga para cima. Não é por razões ortopédicas, mas por prevenção de morte súbita. Evite deixar o bebê muito tempo em carrinhos ou carregadores tipo “moisés”, pois pode aumentar o risco de torcicolo muscular congênito.
7 – Sobre o “pé chato” dos pequenos. Verdade ou mentira que as palmilhas, botinhas e sapatos ortopédicos resolvem o problema?
É mentira! Não resolvem. O arco do pé é formado por genética e surgirá entre os dois e dez anos de idade. Depois desse período, ou formou, o não formou; não tem nada que o molde.
8 – Os pais devem ou não deixar as crianças andarem descalças? O que você recomenda?
Sim! Uma das melhores coisas que pode ser feita pela criança é deixá-la andar descalça. Deixe que sinta a textura dos diferentes tipos de piso, pois isso ajuda no desenvolvimento motor e de coordenação. No entanto, ao contrário do que se fala, não fará com que o arco do pé seja desenvolvido. Isso é um mito.
9 – Crianças podem desenvolver dores na coluna ou na lombar assim como os adultos? Como os pais podem evitar o problema?
Antigamente era uma raridade criança sentir dores nas contas. No entanto, com a vida moderna e a tecnológica – televisões, celulares e tablets – isso se tornou comum. As dores estão relacionadas com a permanência em uma mesma posição por muito tempo, ou, ainda, manter a inclinação do corpo muito para frente ou curvado para conseguir mexer no equipamento. E ainda existe o mobiliário escolar que, muitas vezes, não é adequado, como vários estudos comprovam. A consequência é o desenvolvimento de dores na lombar e região dorsal, perto do pescoço. Para evitar, o ideal é corrigir a postura e adequar à ergonomia do espaço, fazendo com que a criança, ao acessar o computador, por exemplo, esteja sentada com a coluna reta, a tela na altura dos olhos, o cotovelo fletido em 90º e apoiado na mesa para digitar. Para o celular, providenciar um apoio, para que a cabeça não fique inclinada, também é uma boa opção.
10 – É verdade que o uso de tabletes e celulares pode causar a síndrome do pescoço de smartphone? O que é a doença, como acontece e quais as consequências?
Sim, é verdade! Essa é uma doença descrita pela primeira vez em 2007, mas que até então era diagnosticada em cirurgiões e outros profissionais que curvam muito a cabeça. O grande problema é permanecer com a cabeça inclinada para frente. Imagine que uma cabeça que pesa em torno de 5kg, passa a pesar 28kg! A musculatura precisa se esforçar muito para segurar a cabeça, o que gera dores e sobrecarga óssea – levando a uma artrose precoce. Ainda não existem estudos de como isso se desenrola nas crianças. No entanto, na experiência com adultos, no caso dos cirurgiões, que começam a operar com 30 anos de idade, por exemplo, existe a artrose. Já vemos crianças de cinco anos com esse problema!
Informações: Assessoria de Imprensa.