O texto de hoje seria sobre como foi o carnaval com três peludos em casa, mas, infelizmente, precisou ser mudado. Talvez não seja o que todos gostariam de ler, mas é preciso, sim, tocar nesse assunto: a hora da partida deles, dos nosso filhos peludos.
Na última madrugada de segunda para terça, no meio do carnaval, minha filha Paçoca desencarnou. Era idosa, já havia passado por muita coisa (foi resgatada por um amigo meu e adotada por mim no mesmo dia, mas já idosa, em novembro de 2014, ou seja, devia ter hoje aproximadamente 14 anos). Ela chegou com a doença do carrapato, muito debilitada. Cuidamos, tomou todas as medicações devidas, demos muito amor e ela se curou.
Quase um ano depois, no final de 2015, minha outra filha, a Bela, faleceu devido a um câncer. Paçoca ficou triste. Mas não era apenas isso. Estava com uma infecção, Piometra, e foi operada às pressas apenas três dias após a morte da Bela. Cirurgia de alto risco, com apenas 20% de chances de sair com vida da sala de cirurgia. Sobreviveu, ficou internada alguns dias, e depois passou a fazer o tratamento em casa. Foram meses de coleta de sangue semanal, aplicação de soro subcutâneo duas vezes ao dia, remédios e mais remédios aplicados (ela não aceitava em comprimido), papinha na boca, água pela seringa. Até que em março de 2016 ela foi considerada curada, os exames finalmente mostravam o melhor.
O ano passou, eu mantive uma alimentação natural sem ração, e ela sempre feliz, com seus pulinhos lindos, aqueles olhos negros e redondinhos, e aqueles pelinhos fininhos que a transformavam quase em um urso. Ninguém acreditava que fosse idosa. Era a minha Paçoquinha feliz. Ninguém, absolutamente ninguém, conseguia não se encantar com tamanha ternura no olhar.
Então, em novembro de 2016, chegou o Gonçalo, que havia sido resgatado das ruas por duas amigas. Chegou também com a doença do carrapato. Foi cuidado e iria para a castração assim que o tratamento acabasse. Nesse meio tempo, no réveillon, resgatamos uma cachorrinha na rua que estava fugindo dos fogos, para quem demos o nome de Magrela. Levamos para exames, estava ótima, já era castrada (não sabemos até hoje se fugiu ou se alguém colocou na rua.).
Então, me tornei mãe de três peludos lindos, saudáveis e felizes.
Em janeiro, então, resolvemos dar prosseguimento a castração do Gonçalo, e, para isso, seria preciso fazer um exame de sangue. Pensei, então, embora tivesse pouco tempo do último exame da Pacoca, em fazer outro, algo como rotina mesmo. E fiz. E deu uma alteração. Uma amiga querida, que é veterinária, pediu que repetíssemos, e assim foi feito. Novamente veio a alteração, mas nada que indicasse algo grave, apenas que teríamos que voltar com a aplicação de soro subcutâneo e observar para que os rins não fossem sobrecarregados. Não havia infecção, não havia taxas absurdamente altas, nada. E isso foi na última sexta-feira, dia 24 de fevereiro, antes do carnaval começar.
O sábado, o domingo e a segunda foram normais, como todos os dias. Três refeições diárias para os três, todo mundo jogado em suas camas curtindo o ar condicionado, correria e brincadeiras em casa. Até que no final da tarde de segunda, dia 27, eu e meu namorado fomos ao cinema, assistir ao filme La La Land. Eu queria muito assistir, mas, de alguma forma, estava incomodada dentro do cinema, querendo sair dali. Achei que fosse alguma besteira, e continuei. Ao sair, liguei para casa e minha mãe estava chorando. Minha irmã pegou o telefone e pediu para falar com o meu namorado. E ali começou um dos piores dias da minha vida. Paçoca, que meia hora antes havia comido e estava brincando, caiu. Minha mãe achou que tivesse tropeçado, e foi levanta-la. E então percebeu que não se mexia e estava gemendo. Voltamos correndo para casa, minha irmã já na porta do prédio esperando com a minha filha no colo, e corremos para o veterinário, um dos poucos que estava aberto 24h em pleno feriado de carnaval. Lá, não tinha muito o que fazer, já que, infelizmente, não existem muitas opções para exames de emergência para peludos durante feriados e finais de semana. Fez o exame de rotina, apenas com as mãos, e percebeu que ela estava com dor na região da barriga. Tomou remédios, soro, e parecia estar melhor, inclusive andando. Mas, antes de sairmos de lá, já perto da porta, ela caiu e a gengiva ficou branca. O desespero se tornou ainda maior.
Descobrimos, então, uma clínica na Barra (moramos na Tijuca) que fazia exames de madrugada e fomos correndo com ela. No trajeto, ela se mexia, chorava, mas nada que me mostrasse que seria o fim, pelo menos não naquele momento. Chegamos ao nosso destino, e imediatamente a veterinária coletou sangue e a internou, colocando-a no balão de oxigênio. Pedi para ficar com ela, mas a veterinária disse que não poderia. Pedi, então, que Paçoca fosse sedada, para não perceber que estava sozinha, e ela disse que também não poderia, pois qualquer sedação iria matá-la. Concordei, então. Com o coração saindo pela boca, subi até a internação, a beijei muito, pedi desculpas por deixa-la lá sozinha naquele momento e que melhorasse durante a noite, mas que eu estaria lá no dia seguinte para vê-la. Mas meia hora depois ela convulsionou, teve duas paradas respiratórias e não aguentou. E meu mundo caiu!
Hoje, dois dias depois, um buraco está aberto no meu coração, uma dor que não consigo descrever. Olho para os lados, e fico imaginando ela em todos os cantos da casa, com seus passos lentos, suas orelhas para cima, seus olhinhos cheios de amor por mim. Fecho os olhos e só vem a imagem dela lá, mexendo as patinhas enquanto estava no oxigênio, como se quisesse me seguir e voltar comigo para casa; ou já sem vida, quando a segurei nos meus braços e beijei todo o seu rostinho e corpo. Fico procurando informações que possam amenizar a minha dor, amigos que possam dizer que foi o melhor para ela, lembranças que tentem me alegrar. Mas não funciona. Não funciona porque, assim como acontece com as mães que perdem seus filhos humanos, mães de animais vivem um luto que vai durar para sempre. Já perdi dois filhos antes, Igor e Bela. Mas eles tiveram câncer, então, de alguma forma, eu sabia que a morte estava mais perto e precisava me preparar. Não que essa informação pudesse diminuir a dor de perdê-los, pois não diminui. É a mesma. Mas, de alguma forma, nos prepara para o que está por vir.
Mas Paçoca teoricamente não tinha nada. E foi embora. Assim, rapidamente. A hipótese provável é que, pela idade, ela fosse renal – os exames mostraram um aumento absurdo da creatina entre a sexta anterior e a terça, no dia de sua morte. E como era extremamente resistente, nunca apresentou algo que pudesse sinalizar para algum problema. Quando apareceu o sintoma, não havia mais nada a ser feito. Convulsionou de dor. O lado “bom”? É que ela não passou por um sofrimento longo, como o Igor e a Bela, com tratamentos etc. Passou mal e morreu em poucas horas. O lado ruim? O vazio, o não entendimento, a dor, a saudade, a culpa por ter deixado algo passar e tudo mais que não teve um “aviso prévio”.
Escrevo tudo isso como forma de tentar amenizar a minha dor, mas também para que fiquem atentos sempre. Eles são seres únicos, agradecidos por serem tão amados. E, às vezes, parecem bem, mas do nada algo os leva. Meu desespero maior, além de não poder tirar a sua dor, foi não saber o que fazer, para onde leva-la, já que era feriado e tudo estava fechado. Portanto, se o conselho de uma mãe de peludos valer – e acho que vale para mães de peludos e de humaninhos -, tenha uma lista pronta com contatos de quem procurar se algo assim acontecer. Pensem que imprevistos acontecem, que tudo pode mudar em um único segundo. E os ame, incondicionalmente, com toda força, com todo afeto e cuidado. Porque eles vão embora muito rapidamente.
A dor dilacera, a saudade arrebenta por dentro. Mas, pelo menos, existe a certeza que eu fiz tudo que estava ao meu alcance, com dedicação e muito amor. Vá em paz, minha Paçoquinha. Mamãe vai te amar para sempre.