Alguns dizem que, quem nunca teve o amor de avós, não sabe o que é amor. E é verdade! Junto como os pais, os avós têm papel fundamental na vida dos netos. São eles que dão mil desculpas para as besteiras que as crianças fazem, que brincam sem ter hora para terminar, que fazem as comidinhas mais deliciosas. E também parte deles a chamada “medicina de vó”. Afinal, quem nunca tomou algum remedinho ‘milagroso’ feito por eles?
Receitas de xaropes, chás, pomadinhas caseiras, entre outras dicas, fazem parte do vasto conhecimento das avós. Que a informação é passada com amor e com o maior cuidado do mundo, já sabemos. Mas será que a medicina concorda com os conselhos que recebemos dessas figuras tão amadas?
O médica Carla Dall Olio, coordenadora da emergência pediátrica do Hospital Barra D’Or, desmistifica dez recomendações que foram cultivados por gerações e que são muito estimuladas até hoje.
- Chá de picão para icterícia – Todo bebê ou criança que apresente cor amarelada deve ser levado ao pediatra para avaliação pediátrica o quanto antes. O amarelado da pele ou dos olhos é sempre um sinal de alerta a diversas patologias, como, por exemplo, as hepatites infecciosas. Não há indicação de banho de imersão ou ingestão de chá de nenhuma erva ou folha.
- Fralda com álcool no pescoço contra tosse – O álcool, dependendo de sua concentração, pode lesionar a pele quando em contado direto com a mesma. O álcool usado em compressas no pescoço, ao ser inalado, pode provocar ou piorar uma crise de chiado (broncoespasmo) ou rinite, por ser o produto irritante para as vias aéreas. O mesmo risco oferecem os produtos como bálsamos compostos de menta e cânfora, pois, mesmo que deem uma sensação de desobstrução nasal imediata, ao longo das horas, o efeito pode ser contrário, gerando posterior aumento da produção de muco e também o chiado. O que pode ser aproveitado desta prática é a utilização de compressas feitas com pano molhado em água mais gelada, para auxiliar na redução da febre. As melhores áreas para utilizar compressas frias são as têmporas, axilas e a virilha.
- Dar medicamentos antes de dormir para prevenir febres e gripes – Nenhuma medicação deve ser oferecida sem um objetivo terapêutico definido pelo pediatra. Antitérmicos não evitam a evolução da gripe. Além disso, a febre é um sintoma clínico importante para a percepção de uma infecção, pelo seu médico, e mascarar a febre pode só retardar o diagnóstico. O uso excessivo de medicamentos sempre implicará nos riscos de efeitos adversos. Como exemplo, um anti-inflamatório usado sem necessidade pode causar lesão na mucosa gástrica e levar a sangramento gástrico ou até causar uma reação alérgica grave como a anafilaxia com fechamento de glote. Nenhuma medicação deve ser feita sem orientação médica cautelosa.
- Compressa de chá de camomila para peles queimadas pelo sol – A pele queimada pelo sol fica sempre muito sensível. Não se deve aplicar nada sem avaliação do dermatologista ou pediatra, que irá avaliar o grau de queimadura. Aplicar substâncias alimentícias poderá até provocar uma infecção no local sensibilizado. As pessoas têm a impressão de melhora por conta do alívio proporcionado pela diferença de temperatura (pele quente x compressa de chá mais gelada). No entanto, existem medicações de uso tópico e cremes hidratantes próprios para a pele e que não vão levar ao risco de uma infecção secundária e vão auxiliar efetivamente na reparação da pele de forma segura.
- Maisena contra assadura e brotoeja – Uma característica do amido de milho presente na maisena é reduzir a umidade da pele. Isso ajuda no incomodo da brotoeja, que é determinada pela presença de suor que obstruiu o folículo. Da mesma forma age o talco. Porém, a questão é a localização da brotoeja ou assadura que pode impossibilitar a aplicação desses produtos, que oferecem risco de serem inalados pela criança, principalmente por bebês, quando as lesões são no pescoço. Portanto, pode aplicar a maisena, mas é preciso cautela. Contra assaduras, o ideal é trocar as fraldas com mais frequência, higienizar o local com água e sabão, e secar de forma efetiva e delicada com uma toalha macia, usando menos os lenços umedecidos. Lembrando que no mercado existem diversos pomadas e soluções emolientes próprias para solucionar esses problemas.
- Maisena na água do banho para melhorar coceiras na pele – Funciona em crianças que têm dermatite atópica, causando alívio na coceira e o incômodo das dermatites de origem alérgica. Mas também existem produtos próprios para tratar essa patologia, sendo menos usado de rotina.
- Medicamentos com funcho para alívio da cólica – Este tipo de medicamento é usado para “ consolar” o bebê do desconforto da dor abdominal. O ato de chupar a chupeta com um produto doce proporciona um alívio momentâneo, mas não é o mais indicado para cólicas. Estas dores devem ser tratadas com analgesia e formulações próprias com lactobacillus. O ideal é discutir com o pediatra o melhor tratamento, para não recorrer a mais uma solução paliativa pouco resolutiva.
- Usar agasalho para não resfriar – No frio, é preciso ter cuidado com a diferença de temperatura que oscila ao longo do dia. As roupas quentes são mais para dar conforto do que para proteger de gripes e resfriados. Essas doenças são compartilhadas através de vírus e bactérias. O ambiente fechado no inverno e com aglomeração de pessoas facilita o contágio por vias aéreas, além das mãos que levam os agentes infeciosos para a boca e o nariz. Se a criança tiver alergia respiratória, ela irá sentir mais o baque da mudança de temperatura, ficando mais vulnerável à rinite, asma e bronquite. Por isso, o cuidado para manter a temperatura da casa uniforme é uma boa medida. Um ponto importante é incentivar a lavagem das mãos, especialmente pelos cuidadores dos pequenos.
- Mel para expectoração do catarro e tosse – Mito. O conforto é imediato apenas para a via área superior, mas não é terapêutico. Além de não poder ofertar às crianças menores de um ano, pois pode causar botulismo.
- Moeda no umbigo para evitar hérnia umbilical – Mito. Não pode colocar moeda, cinteiro, pó de café, teia de aranha ou qualquer outro corpo estranho, principalmente se o umbigo ainda não estiver plenamente cicatrizado. A hérnia umbilical vai se resolver ao longo do crescimento da criança até os dois anos de idade. Procure seu pediatra que irá avaliar o tamanho da hérnia umbilical e, se necessária, a correção cirúrgica, encaminhará para avaliação do cirurgião pediatra.
Mas vale lembrar um detalhe: se por um lado as orientações médicas são fundamentais para a saúde e o bem-estar dos pequenos, o amor e o cuidado dos avós ainda são os melhores remédios para netos felizes e cheios de amor.