Aventuras Maternas

Todo cuidado é pouco

Se você já engravidou, certamente ouviu a frase ‘gravidez não é doença’ algum dia, certo? E não é mesmo. Entretanto, quando temos um bebê dentro da gente, uma série de mudanças acontecem em nosso corpo. E, entre essas mudanças, estão as variadas reações que nosso organismo pode ter a determinados produtos. E não apenas nós, como nossos filhos dentro da barriga também. Pode ser um remédio que não é mais adequado ou um creme que tenha um componente contraindicado. Por isso, é tão importante informar todos os hábitos que fazem parte do seu dia a dia para sua obstetra e dermatologista.

Conversamos com o dermatologista Tiago Silveira Lima, que vai explicar um pouco mais sobre o assunto.

AM – Quais os problemas de pele – no rosto e no corpo – mais comuns que as mulheres podem desenvolver com a gravidez?

Tiago Silveira Lima – É muito comum na gestação as alterações pigmentares. Há escurecimento de manchas preexistente até de sardas e sinais. Pode aparecer uma mancha muito comum e que preocupa muito as mulheres, o melasma ou cloasma gravídico, que são manchas acastanhadas, principalmente na face, muito sensíveis ao sol. Ocorre também o escurecimento da genitália, mamilos, aréola, axilas, virilha e da linha no centro da barriga, que cruza o umbigo. Também pode haver hirsutismo (aumento dos pelos do corpo) e até os cabelos do couro cabeludo podem ficar mais bonitos e volumosos no início da gestação. É comum surgir estrias de distensão no abdome, seios e nádegas. Há, ainda, piora da circulação, incluído hemorroidas, varizes e outras lesões relacionadas à veias. Pode haver também piora da acne, e as coceiras sem causa aparente são muito comuns. Mais raramente surgem doenças que trazem aparecimento de “bolinhas”, manchas vermelhas e até bolhas, que normalmente vem acompanhadas de coceira.

AM – Quais produtos/componentes devem ser evitados? Em toda gestação ou apenas nos primeiros meses?

Tiago Silveira Lima – Muitos dos produtos e medicamentos são relativamente contra-indicados na gestação por falta de estudo e evidências do malefício, já que não seria ético e conveniente fazer alguns tipos de estudos e testes em gestantes. Dos medicamentos de uso oral (de tomar) são sabidamente teratogênicos (podem causar má formação) os metotrexato, inibidores da enzima de conversão de angiotensina, carbamazepina, ciclofosfamida, danazol, dietilbestrol, drogas hipoglicemiantes, lítio, misoprostol, fenitoína, barbitúricos, benzodiazepínicos, propiltiouracil, metimazol, retinóides sistêmicos, tetraciclinas, talidomida, ácido valpróico, varfarina etc. Em relação aos medicamentos tópicos (de aplicar), não existe grande evidência de teratogenicidade neles e acredita-se ser pouco provável, se forem usados da forma correta, na quantidade correta, em áreas pequenas de pele e na pele íntegra (sem machucados). De qualquer forma, os medicamentos contra-indicados por via oral, por inferência, também são contra-indicados por via tópica (como a tretinoína e isotretinoína, por exemplo). Além disso, como mencionado, muitos medicamentos não têm estudos que liberem sua segurança. Então, mesmo no caso de medicação de aplicar, é prudente escolhermos os que comprovadamente não causam má formação. Toda e qualquer medicação tem maior risco de causar danos no primeiro trimestre. Porém, há relatos também de complicações com o uso de substâncias após os primeiros três meses (como as tetraciclinas – antibióticos), e por isso, a contra-indicação se mantém na gestação toda.

AM – Normalmente, as pernas ficam mais inchadas, pesadas. Como as mulheres podem aliviar esse incômodo?

Tiago Silveira Lima – Pode ser feito repouso com elevação dos membros. Massagens adequadas para auxiliar o retorno do sangue também são úteis. Podem ser formulados e prescritos produtos contendo centella asiática, além de concentrações adequadas de arnica, gincko biloba, calêndula, castanha da índia, alantoína, ceramidas e óleos, como o óleo de semente de uva e a manteiga de karité.

AM – As costas também costumam doer, assim como a região da cintura. O que aplicar nesses locais? O mesmo produto das pernas?

Tiago Silveira Lima – Podem ser aplicados os mesmos produtos calmantes e hidratantes. A avaliação do seu obstetra ou até de um ortopedista também é indicada, para prescrição de medicações para dor, se necessário.

AM – Na pele do rosto, o que podem aplicar e o que evitar?

Tiago Silveira Lima – Podem ser aplicados muitos antioxidantes, como a vitamina C (que rejuvenesce e clareia a pele). O ácido azelaico e a niacinamida são outros coringas, que servem como clareadores e anti-acne. O ácido glicólico em doses indicadas também é permitido. Devemos evitar muitos dos clareadores, como a hidroquinona, e os retinoides (derivados de vitamina A), como retinol, retinaldeído, ácido retinoico, tretinoína e adapaleno. Melhor também contra-indicar o ácido salicílico.

AM – Algumas mulheres desenvolvem melasmas. É possível evitá-los aplicando algo ainda durante a gravidez?

Tiago Silveira Lima – Com certeza! É interessante aplicar os clareadores, vitaminas e antioxidantes seguros desde o início da gestação, e especialmente abusar do uso de filtro solar, principalmente os filtros físicos (inorgânicos), que com certeza não são absorvidos pela pele.

AM – E para aquelas que têm acnes? Tem que suspender o tratamento? Por quê?

Tiago Silveira Lima – Grande parte do tratamento para acne tem potencial teratogênico. Entretanto, mesmo que não se possa usar tudo, existem, sim, produtos que podem ajudar na melhora da acne da grávida. Elas podem, inclusive, manter sessões periódicas de peelings físicos, como peeling de cristal e diamante, e limpeza de pele.

AM – E as que têm rosáceas?

Tiago Silveira Lima – Elas se beneficiam seguramente do ácido azeláico, niacinamida, entre outros. Reforçamos aqui os cuidados não medicamentosos, como proteção solar e dieta.

AM – Por quê a canfora não é permitida para as grávidas usarem para aliviar as dores musculares?

Tiago Silveira Lima – É controverso o quanto a cânfora nas concentrações encontradas nos cremes pode ser absorvida, mas é prudente evitá-la na gestação por uma suspeita de possível passagem pela placenta até o feto.

AM – O que as mulheres grávidas devem usar para tratar as estrias que acabam aparecendo durante a gestação? Podem começar a cuidar enquanto grávidas ou apenas após o nascimento dos bebês?

Tiago Silveira Lima – As gestantes devem começar a prevenção das estrias já no início da gravidez e utilizar produtos para trata-las caso apareçam. Existem vários cremes prontos já vendidos em farmácias comuns. A prevenção se faz com óleos, como o de amêndoa doce (abuse dele!) e semente de uva, além de lactato de amônio em doses baixas, entre outros. Os hidratantes devem ser aplicados várias vezes por dia, principalmente nas áreas que vão esticar mais.

AM – O que o uso de produtos proibidos (ou não aconselháveis) para as grávidas pode acarretar no bebê?

Tiago Silveira Lima – Podem causar diversos tipos de má-formação. Porém, como foi dito, muitos deles ainda estão a nível de especulação.

AM – Em alguma fase da gestação todos os produtos usados antes da gravidez ficam liberados ou apenas após o nascimento?

Tiago Silveira Lima – A maioria, na verdade, não são liberados nem após o nascimento, e, sim, após o término da lactação, já que há ainda a possibilidade teórica da passagem do produto para a criança pelo leite materno.

AM – É preciso informar ao médico qualquer produto que use para a pele, ou hidratantes mais comuns – como Fisiogel – são liberados em qualquer fase?

Tiago Silveira Lima – Sempre é importante informar ao ginecologista/obstetra e ao dermatologista sobre os produtos utilizados. Nada deve ser usado sem orientação, nem os hidratantes comuns. Grande parte deles, por exemplo, apresenta o composto Uréia, na concentração maior que 3%, o que é contra-indicado na gravidez.

AM – Quais componentes as grávidas podem aplicar na pele (se não forem especificamente alérgicas a algum) do rosto e do corpo sem medo?

Tiago Silveira Lima – Praticamente não existem substâncias nesta categoria, de 100% de segurança na gestação. A maioria dos produtos liberados se encontram na categoria B, pelo FDA (órgão regulatório americano), conforme a tabela abaixo. Por isso, qualquer tipo de medicamento só deve ser usado se necessário, da forma correta, na menor quantidade e tempo possíveis, pesando risco-benefício.

AM – E o que é terminantemente proibido durante a gravidez? E após o nascimento, mas ainda na fase da amamentação? Quando digo proibido não é para apenas evitar, é porque não pode ser usado de forma alguma.

Tiago Silveira Lima – Terminantemente proibido são algumas medicações orais, como metotrexato, inibidores da enzima de conversão de angiotensina, carbamazepina, ciclofosfamida, danazol, dietilbestrol, drogas hipoglicemiantes, lítio, misoprostol, fenitoína, barbitúricos, benzodiazepínicos, propiltiouracil, metimazol, retinóides sistêmicos, tetraciclinas, talidomida, ácido valpróico, varfarina etc. Topicamente é terminantemente proibida a isotretinóina, monossulfiram e lindano por relatos de má-formação.

AM – Repelentes de qualquer tipo estão liberados ou apenas algum tipo especial?

Tiago Silveira Lima – Já existem vários repelentes específicos para grávidas no mercado, principalmente após o surgimento da zika e hidrocefalia. Eles costumam ter quantidades controladas, porém eficientes das substâncias, como, por exemplo, DEET entre 10 e 50%. A Icaridina também parece ser segura. Preferencialmente, a grávida pode usar produtos naturais como citronela e andiroba a 100% em óleo (com constante reaplicação). A gestante deve ainda lançar mão da proteção física de telas, evitar ambientes com mosquitos e aplicar solução de Permetrina 4 a 5% nas roupas, em vez da pele, reduzindo absorção de substâncias.

AM – Colorir cabelos pode?

Tiago Silveira Lima – É incerto o quanto das tintas de cabelo são absorvidas pela gestante, mas sabe-se que o chumbo encontrado em produtos de salão de beleza pode ser prejudicial. Já houve estudos que sugerem aumento na incidência de um tipo de câncer infantil em filhos de mães que tingiam os cabelos. É melhor evitar tinturas no primeiro trimestre. Se for feita coloração a partir do segundo trimestre, deve-se dar preferência a tonalizantes ou, ainda, de maneira mais segura, a produtos naturais, como a hena pura. Ainda assim, aconselhamos que o produto seja aplicado apenas nos fios, com contato mínimo com a pele, e que o processo seja realizado em ambiente bem ventilado.

AM – Mais alguma informação que queira adicionar?

Tiago Silveira Lima – Procure um dermatologista assim que descobrir a gravidez! Dessa forma, você conseguirá prevenir as alterações indesejáveis da pele com segurança. Não use nada, desde o sabonete, até o hidratante e filtro solar, sem comunicar com seu dermatologista.

 

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Priscila Correia

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