Por Ellen Moraes Senra
Imagine a situação: você está num programa para responder questões sobre o seu trabalho e entra uma participante ao vivo ‒ até aí tudo bem ‒ porém, a questão é que a participante é uma médica renomada e ela não tem exatamente uma questão sobre sua profissão, mas sim um “desafio” para fazer a profissional emagrecer.
Isso mesmo!
Durante a sua participação no programa Mulheres, da TV Gazeta, com um assunto muito pertinente na atualidade, a violência contra a mulher, a advogada Sandra Daniotti se viu presa num constrangimento sem fim. Ela foi desafiada por uma médica a emagrecer com sua ajuda e de uma equipe. Então, a advogada aceitou o desafio, mas ficou claramente desconcertada, o que revolta ao assistirmos a cena e o que nos leva ao questionamento sobre a falta de bom senso do ser humano.
O que ocorre é que quando alguém deseja perder peso ela mesma procura por ajuda e não importa o grau de suposta preocupação: é extremamente invasivo tirar essa escolha das mãos da pessoa ao colocá-la contra a parede durante sua contribuição profissional em um programa de TV.
Isso sem falarmos no desvio de um assunto tão importante para focar no peso de alguém, para voltarmos os olhares para esse detalhe e, principalmente, para fazermos com que essa pessoa se sinta mal e perca a fala diante de tamanha invasão.
Curioso é que quando alguém está abaixo do peso essas preocupações não se dão dessa forma, o que nos leva a questionar de todas as formas possíveis o quanto a tal preocupação é real e o quanto o que incomoda, de fato, é realmente alguém fora dos padrões impostos pela nossa sociedade.
Muito além da preocupação real
Sei o que pode ser questionado aqui, mas e a saúde? E os problemas que o sobrepeso pode trazer para a qualidade de vida? E daí por diante.
E aí que eu lhes questiono: E os problemas que impor algo para alguém pode trazer para a autoestima dessa pessoa? O que ser colocada contra a parede durante uma contribuição profissional na frente de inúmeras pessoas pode provocar em alguém? O que dá a alguém o direito de questionar o que o outro deve ou não fazer através de um suposto desafio fora de contexto e em momento impróprio?
Verdade seja dita, o bom senso se perdeu do ser humano ou o ser humano se perdeu do bom senso já há algum tempo e fico extremamente triste ao ver o quanto as pessoas não percebem os impactos de suas ações para o outro, o quanto nos falta empatia e como pensam em se promover em detrimento do outro, pois, veja bem, na melhor das hipóteses, a advogada conseguindo perder peso, quem brilha não é ela e sim a médica que a desafiou.
Ou seja, uma mulher que se colocou à disposição para tirar dúvidas jurídicas e a outra que se apropriou da situação para mudar o foco de algo importante para algo que não lhe foi solicitado acaba tirando um proveito gigantesco disso. E diante de uma surpresa desagradável, de péssimo tom na forma como foi feita, um desrespeito a uma profissional e um uso completamente descabido de um veículo de mídia importante.
Que todos possamos parar de mascarar nossas intenções disfarçando-as de preocupação e que possamos deixar as mulheres livres para fazerem suas próprias escolhas sobre o seu corpo, seu cabelo, sua saúde, afinal, não se obriga alguém a fazer o que não deseja e tampouco deveria ser permitido encurralar e envergonhar utilizando as mesmas desculpas.
Apenas reflitam e pensem duas vezes antes de tornar público sua preocupação com o que quer que seja, a não ser que diga respeito a sua própria vida.
Informações: Assessoria de Imprensa.