A recente notícia de Elaine Bastos, viúva de Paulinho Santos, vocalista do Roupa Nova, dos planos de gestação pós-morte do cantor, através de inseminação artificial com os gametas congelados antes de seu falecimento, instigou a curiosidade de muitas pessoas sobre o assunto.
Paulinho foi diagnosticado com coronavírus enquanto se recuperava de um transplante de medula óssea que havia feito em setembro para tratar um linfoma – no procedimento, foram utilizadas as próprias células do paciente, que respondeu bem ao tratamento. No entanto, em novembro, ele precisou ser novamente internado, desta vez com Covid 19, quando veio a falecer.
Abaixo, a especialista em reprodução humana Maria Cecília Erthal, médica diretora do Vida Centro de Fertilidade, tirou as principais dúvidas sobre o tema:
Na fertilização in vitro, como é feita a seleção dos embriões que serão implantados?
R: Temos duas maneiras de selecionar os embriões no laboratório: a primeira é através da morfologia, que é a que mais frequentemente é realizada, onde a gente avalia o desenvolvimento desses embriões no laboratório durante o cultivo embrionário, avaliamos como eles fazem o processo de multiplicação celular, a presença dos núcleos nas células, a morfologia do citoplasma, tudo isso nos dando a noção da boa qualidade através desse bom desenvolvimento morfológico desses embriões no laboratório. Mas também podemos fazer a seleção através do estudo genético, onde estabelecemos que aqueles embriões analisados tem um número correto de cromossomos e com isso nos dá o respaldo de ter um bom desenvolvimento genético.
O que acontece com os embriões que não são usados?
R: Os embriões que não são utilizados, ou seja: o casal engravidou e tiveram sobras de embriões, eles podem ficar congelados pelo período que esse casal determinar, para serem utilizados no futuro, e gerarem uma nova gestação para aquele casa, eles podem ser doados para outros casais, ou o que está se discutindo hoje em dia com a nova regulamentação do Conselho Federal de Medicina, é a questão do descarte ou não, que a princípio necessitaria de uma autorização judicial. Até a última resolução do CFM, que estava valendo até 15 de julho de 2021, a partir de três anos os embriões poderiam ser descartados com a autorização do casal – mas desde então, a partir dessa mesma data, temos uma nova regulamentação do CFM, que ainda está em discussão, que o descarte só poderia acontecer, com a autorização judicial.
Como funciona a reprodução assistida pós-morte?
R: Na reprodução humana assistida, existem situações em que gametas são deixados congelados, já com autorização para serem utilizados após o falecimento que tiveram seus gametas criopreservados, ou seja, óvulos ou espermatozóides. Então, essa reprodução assistida pós-morte só pode acontecer caso o falecido tenha deixado uma autorização que autorize a utilização de seus gametas que ficaram congelados.
Por quanto tempo os óvulos ou sêmen podem ficar congelados?
R: Não existe um prazo pré-determinado para que óvulos ou sêmen permaneçam congelados ou tenham que ser descartados. Na realidade, na maioria das vezes, em pouco tempo, em prazo curto ou médio, esse material é utilizado, mas até então, nunca se estabeleceu um prazo, para que eles fiquem congelados.
A princípio, o congelamento preserva todas as boas características da célula, congelando e paralisando o metabolismo, ela preserva as características genéticas da célula, então não teria um prazo pré-determinado para que a gente tivesse a obrigação de usar ou descartar aquele material que foi congelado.
Qual a validade legal da inseminação artificial pós-morte do(a) parceiro (a)?
R: A validade legal da inseminação artificial pós morte está amparada na resolução do Conselho Federal de Medicina, então pela regulamentação desse conselho, ela só pode ser realizada quando o parceiro deixa essa autorização prévia. Então muitos casos de homens que já tem esse diagnóstico de câncer, que já sabem que têm um risco muito grande de vir a falecer, ou que gostariam que suas esposas (ou vice versa, a mulher com câncer, que deixaria para seu esposo a utilização dos gametas), tendo essa autorização prévia ao falecimento não teria nenhum problema. Porque na ausência de lei, essa regulamentação do conselho federal de medicina tem valor legal. Quando a gente fala em gameta masculino, que é o espermatozóide, é mais fácil, porque a mulher tem o útero e tem o ovário. Então ela pode usar aquele gameta para fertilizar seus óvulos, fazer embriões no laboratório e transferir para o útero. Quando é o contrário, quando são gametas femininos, é mais difícil, porque o homem teria que ter, a princípio, uma barriga solidária, um útero de substituição para engravidar daquele bebê, daquele embrião proveniente dos óvulos da esposa com o espermatozoide dele.
Homens podem fazer uso do material genético da esposa falecida usando útero de substituição. Como acontece esse processo?
R: Do mesmo jeito que o homem pode deixar seu material congelado, a mulher também pode. E teríamos que fazer a utilização de um útero de substituição, também dentro da regulamentação do Conselho Federal de Medicina, com parentes até quarto grau, que é o permitido no que diz respeito ao útero de substituição. De qualquer forma, tem que ter também uma autorização daquela mulher que deixou os óvulos congelados antes do falecimento dela para que esses óvulos fossem utilizados com o intuito de formar embriões e a gravidez acontecer através de uma barriga solidária.
Informações: Assessoria de Imprensa.