Quantas vezes já não dissemos “Nossa, são filhos dos mesmos pais, mas são tão diferentes”? Embora normalmente esse comentário seja motivado pela aparência física, as diferenças entre irmãos, até mesmo gêmeos, vão muito além dos olhos, cabelo ou porte físico. É a personalidade que faz a maior diferença!
Pesquisas recentes mostram que, dentro de uma mesma família e com irmãos criados da mesmíssima maneira, a personalidade de cada um pode ser muito diferente, ainda que o ambiente e todos os fatores direcionem para o mesmo caminho. O estudo define, por exemplo, que em famílias com três irmãos, normalmente, os perfis seguem características realizadoras, pacificadoras e brincalhonas, de acordo com a ordem de nascença (o primogênito é o realizador, o do meio é o pacificador e o caçula o brincalhão).
E essas diferenças não são observadas apenas por quem “é de fora”. Algumas mães, muitas, percebem claramente isso no seu dia a dia.
Fabiane Albrecht é mãe de três filhos, Marcus Vinícius, com 23 anos, Gustavo, com 21 e Maria Clara, de apenas 11 anos. Ela conta que o primeiro é o mais reservado. Já Gustavo é o mais comunicativo e carismático. E Maria Clara é uma mistura de ambos os irmãos. “Os dois meninos quase não deram trabalho com relação ao comportamento, respeitam até hoje, enquanto que a Maria Clara adora desafiar e questionar”, conta.
Na casa de Deborah Tavares, que também tem três filhos – Bernardo, de 5 anos, Guilherme com 3 e Laís com um -, cada um é dono de uma personalidade diferente, embora complementares. Bernardo é maduro e cuidador, com grande senso de proteção, principalmente com a irmã. Guilherme é destemido e divertido, do tipo que escuta uma música tocando na rua e para pra dançar; e Laís é descolada e carinhosa. “Ela tenta ganhar tudo com sorriso, mas sabe brigar quando acha que deve”, comenta Deborah. Ela acrescenta que apesar de fisicamente semelhantes, a forma de cada um enxergar e lidar com as situações é muito diferente uma da outra. “Ilustro isso contando um ‘causo’: como cada um aprendeu a descer da minha cama, que é relativamente alta. Bernardo tentou descer e caiu. Depois não tentou mais. Resolveu aprender a descer primeiro da poltrona e do sofá, que eram mais baixos e, quando estava craque, tentou de novo a cama, com sucesso. Ele decidiu que era melhor ultrapassar obstáculos menores e de forma progressiva até se sentir seguro novamente pra tentar o mais difícil. Guilherme tentou descer da cama e caiu. Depois tentou de novo e caiu e caiu e caiu e um dia não caiu mais. Ele decidiu que valia o risco de cair, porque uma hora ia conseguir. Já Laís primeiro olhou a distância, depois tentou descer, não sentiu que o pé tocava no chão e voltou a subir, segurando o lençol. Depois de subir na cama olhou novamente a distância. Fez isso algumas vezes durante alguns dias, até que desceu da cama. Ela decidiu analisar e estudar o risco primeiro até se sentir segura pra tentar”, complementa. Ela explica que ainda acha cedo para definir o papel de cada um de acordo com a pesquisa, mas que, hoje, enxerga o segundo como o mais brincalhão e o primeiro como mais pacificador. “A terceira ainda está aprendendo a se expressar. Então, é difícil dizer. Mas o mais importante é que me parece que eles estão entendendo que cada situação demanda uma postura diferente, que tem horas que é bom não ser tão resguardado e que tem horas que precisa ser mais prudente”, finaliza.
Já Renata Montebello é mae de Sophia, de 6 anos, e Isabella, de 2 anos. Ela explica que as duas são muito diferentes, sendo a mais velha super extrovertida, e a mais nova super fechada e séria. Mas, apesar das diferenças de personalidade, uma completa a outra. “A mais velha ajuda muito a mais nova a ser mais solta. Isabella é muito desconfiada de início, mas depois que fica mais íntima se solta bastante. E como o mais novo está sempre imitando o mais velho, acho que esse complemento ajuda. Sophia é muito brincalhona e Isabella muito brigona. Não sei ao certo se posso afirmar aqui na minha casa se a mais velha é a realizadora e a mais nova pacificadora”, diverte-se.
E será que essa diferença de personalidades acontece também quando os filhos são gêmeos? Soraya Amoedo conta que sim. Mãe de gêmeos bivitelinos, ela diz que cada um tem suas particularidades. “Quem nasceu primeiro foi o Gabriel, por uma diferença de dois minutos. Mas já foi suficiente para lhe trazer suas escolhas e suas diferenças pessoais. O Breno é mais arisco, brincalhão, o pimentinha camarada, aquele que toda mãe gostaria de ter como genro. Já o Gabriel é mais concentrado, mais responsável, mais amoroso e perfeccionista. E isso porque só têm quatro anos. Imagine com uns quinze”, brinca. No mais, são super amigos, mas tambem brigam muito por disputa de brinquedos e vontades. Mas quem nunca brigou com irmãos, não é mesmo?”, pergunta.
Também mãe de gêmeos, Christiane Dias conta que seus filhos Carolina e Alberto, de 19 anos, embora sejam gêmeos, não seguem o mito de que deveriam ser iguais. Ela é idealista, posicionada, determinada, vive no futuro, se cobra demais e não aceita nada no nível da mediocridade. Carinhosa, mas reservada, tímida, curiosa no que diz respeito aos assuntos de seu interesse, de humor ácido, às vezes debochada. Já ele é carinhoso, amoroso, generoso, quer a paz e o amor, não entra em conflito, não gasta energia se achar que não está sendo compreendido. É paciente, atencioso, tímido, porém divertido. Por outro lado, os dois têm características em comum, sendo carinhosos, amigos fiéis e bem humorados. Para ela, a pesquisa é perfeita em sua definição: “Ela nasceu primeiro, é a determinada, a que tem mais atitude. É questionadora. Ele, que nasceu quatro minutos depois, é o próprio pacificador, o que tem compaixão, o generoso e mediador. Com meus irmãos também é assim. O mais velho é o realizador, eu a pacificadora e a caçula a palhaça da família”, conta.
E diante de todos esses depoimentos, será que fica comprovada a tese da pesquisa? Para Flavia Moura, definitivamente não. Mãe de Pedro Ignacio com 12 anos, João Miguel de quase 8 e Lourdes de 5 anos, ela conta que as personalidades são bem distintas e todas fortes. Porém, em sua casa, o jeito de cada um não seguiu exatamente a ordem demonstrada no estudo. “O primeiro é super da paz, diplomata, muito inteligente e pacifista, mas tem uma preguiça que se não for trabalhada será sua grande oponente. O do meio é perfeccionista, racional, também muito inteligente, sedutor, muito detalhista e estourado toda vida. Por outro lado, a gente já sabe que ele vai se dar muito bem na vida, porque adora desbravar, descobrir coisas e ama estudar e ser o melhor no que faz. A mais nova é super bem resolvida. Parece que saca tudo da vida e já é capaz de analisar o espírito humano. Ela sai com cada uma de arrepiar os cabelos. Além disso, é linda e adorada, mas não que isso suba à cabeça. Sabe quando a pessoa nasceu popstar? Ela é assim. Brincalhões todos são. Eles simplesmente gostam de rir”, explica Flávia.
E como os pais lidam com as diferenças?
Mas ações e personalidades tão diferentes provocam, muitas vezes, reações diversas dos pais. Generalizando, filhos mais amorosos podem acabar “ganhando” mais afeto; e os mais sérios podem distanciar um pouco as pessoas. Porém, quando se fala sobre relação entre pais e filhos, qualquer modo diferente de tratamento pode causar problemas entre irmãos.
A psicóloga Bianca Pancini explica que o afeto oferecido deve ser da mesma maneira sempre para os filhos, independentemente da reação de cada um. “Um filho conhece sua mãe e seu pai, e, por isso, sabe qual a maneira de amar e de que forma eles a expressam”, explica. Ela comenta, ainda, que havendo problemas e reclamações dos filhos sobre diferenças de tratamento, às vezes a ajuda de um profissional é importante. “O momento de partir para uma terapia seria quando os pais percebessem um prejuízo na vida de um dos filhos, e também quando a situação tiver fugido ao controle dos pais. Os mesmos precisam estar seguros das diferenças entre filhos, porém, a partir do momento que eles considerarem as diferenças como uma dificuldade para lidarem, chegou a hora de pedir ajuda”, complementa.
Dificilmente, filhos, mesmo sendo criados da mesma forma, serão exatamente iguais. Afinal, cada um carrega dentro de si experiências próprias, ainda que crianças, que vão afetar diferentemente cada um. Cobrar mudanças elegendo uma personalidade que seria a “melhor” está longe de ser o correto. Por isso, seja mais afetuoso ou calado, brincalhão ou introvertido, um estudioso ou amante da criatividade, o importante é que eles se sintam amados e incentivados a mostrar o seu melhor, seja como diretor de uma multinacional, um artista plástico ou um mochileiro atrás de aventuras.